sábado, 19 de fevereiro de 2011

O MITO DE SÍSIFO - Albert Camus

O MITO DE SÍSIFO [31]

Albert Camus

Os deuses tinham condenado Sísifo a rolar um rochedo incessantemente até o cimo de uma montanha, de onde a pedra caía de novo por seu próprio peso. Eles tinham pensado, com as suas razões, que não existe punição mais terrível do que o trabalho inútil e sem esperança.

Se acreditarmos em Homero, Sísifo era o mais sábio e mais prudente dos mortais. Segundo uma outra tradição, porém, ele tinha queda para o ofício de salteador. Não vejo aí contradição. Diferem as opiniões sobre os motivos que lhe valeram ser o trabalhador inútil dos infernos. Reprovam-lhe, antes de tudo, certa leviandade para com os deuses. Espalhou os segredos deles. Egina, filha de Asopo, foi raptada por Júpiter. 

O pai, abalado por esse desaparecimento, se queixou a Sísifo. Este, que tomara conhecimento do rapto, ofereceu a Asopo orientá-lo a respeito, com a condição de que fornecesse água à cidadela de Corinto. Às cóleras celestes ele preferiu a bênção da água. Foi punido por isso nós infernos.

Homero nos conta ainda que Sísifo acorrentara a Morte. Plutão não pôde tolerar o espetáculo de seu império deserto e silencioso. Despachou o deus da guerra, que libertou a Morte das mãos de seu vencedor.

Diz-se também que Sísifo, estando prestes a morrer, imprudentemente quis pôr à prova o amor de sua mulher. Ele lhe ordenou jogar o seu corpo insepulto em plena praça pública. Sísifo se recobrou nos infernos. Ali, exasperado com uma obediência tão contrária ao amor humano, obteve de Plutão o consentimento para voltar à terra e castigar a mulher. Mas, quando ele de novo pôde rever a face deste mundo, provar a água e o sol, as pedras aquecidas e o mar, não quis mais retornar à escuridão infernal.

Os chamamentos, as iras, as advertências de nada adiantaram. Ainda por muitos anos ele viveu diante da curva do golfo, do mar arrebentando e dos sorrisos da terra. Foi necessária uma sentença dos deuses. Mercúrio veio apanhar o atrevido pelo pescoço e, arrancando-o de suas alegrias, reconduziu-o à força aos infernos, onde seu rochedo estava preparado.

Já deu para compreender que Sísifo é o herói absurdo. Ele o é tanto por suas paixões como por seu tormento. O desprezo pelos deuses, o ódio à Morte e a paixão pela vida lhe valeram esse suplício indescritível em que todo o ser se ocupa em não completar nada. É o preço a pagar pelas paixões deste mundo. Nada nos foi dito sobre Sísifo nos infernos. Os mitos são feitos para que a imaginação os anime. Neste caso, vê-se apenas todo o esforço de um corpo estirado para levantar a pedra enorme, rolá-la e fazê-la subir uma encosta, tarefa cem vezes recomeçada. Vê-se o rosto crispado, a face colada à pedra, o socorro de uma espádua que recebe a massa recoberta de barro, e de um pé que a escora, a repetição na base do braço, a segurança toda humana de duas mãos cheias de terra. 

Ao final desse esforço imenso medido pelo espaço sem céu e pelo tempo sem profundidade, o objetivo é atingido. Sísifo, então, vê a pedra desabar em alguns instantes para esse mundo inferior de onde será preciso reerguê-la até os cimos. E desce de novo para a planície.

É durante esse retorno, essa pausa, que Sísifo me interessa. Um rosto que pena, assim tão perto das pedras, é já ele próprio pedra! Vejo esse homem redescer, com o passo pesado, mas igual, para o tormento cujo fim não conhecerá. Essa hora que é como uma respiração e que ressurge tão certamente quanto sua infelicidade, essa hora é aquela da consciência. A cada um desses momentos, em que ele deixa os cimos e se afunda pouco a pouco no covil dos deuses, ele é superior ao seu destino. É mais forte que seu rochedo.

Se esse mito é trágico, é que seu herói é consciente. Onde estaria, de fato, a sua pena, se a cada passo o sustentasse a esperança de ser bem-sucedido? O operário de hoje trabalha todos os dias de sua vida nas mesmas tarefas e esse destino não é menos absurdo. Mas ele só é trágico nos raros momentos em que se torna consciente. Sísifo, proletário dos deuses, impotente e revoltado, conhece toda a extensão de sua condição miserável: é nela que ele pensa enquanto desce. A lucidez que devia produzir o seu tormento consome, com a mesma força, sua vitória. Não existe destino que não se supere pelo desprezo.

Se a descida, assim, em certos dias se faz para a dor, ela também pode se fazer para a alegria. Esta palavra não está demais. Imagino ainda Sísifo indo outra vez para seu rochedo, e a dor estava no começo. Quando as imagens da terra se mantêm muito intensas na lembrança, quando o apelo da felicidade se faz demasiadamente pesado, acontece que a tristeza se impõe ao coração humano: é a vitória do rochedo, é o próprio rochedo. O enorme desgosto é pesado demais para carregar. São nossas noites de Getsêmani. Mas as verdades esmagadoras perecem ao serem reconhecidas. 

Assim, Édipo de início obedece ao destino sem o saber. A partir do momento em que ele sabe, sua tragédia principia. Mas no mesmo instante, cego e desesperado, reconhece que o único laço que o prende ao mundo é ó frescor da mão de uma garota. Uma fala descomedida ressoa então: “Apesar de tantas experiências, minha idade avançada e a grandeza da minha alma me fazem achar é que tudo está bem”. O Édipo de Sófocles, como o Kirílov de Dostoiévski, dá assim a fórmula da vitória absurda. A sabedoria antiga torna a se encontrar com o heroísmo moderno.

Não se descobre o absurdo sem ser tentado a escrever algum manual de felicidade. “Mas como, com umas trilhas tão estreitas?” 

No entanto, só existe um mundo. A felicidade e o absurdo são dois filhos da mesma terra. São inseparáveis. O erro seria dizer que a felicidade nasce forçosamente da descoberta absurda. Ocorre do mesmo modo o sentimento do absurdo nascer da felicidade. “Acho que tudo está bem”, diz Édipo, e essa fala é sagrada. Ela ressoa no universo feroz e limitado do homem. Ensina que tudo não é e não foi esgotado. Expulsa deste mundo um deus que nele havia entrado com a insatisfação e o gosto pelas dores inúteis. Faz do destino um assunto do homem e que deve ser acertado entre os homens.

Toda a alegria silenciosa de Sísifo está aí. Seu destino lhe pertence. Seu rochedo é sua questão. Da mesma forma o homem absurdo, quando contempla o seu tormento, faz calar todos os ídolos. No universo subitamente restituído ao seu silêncio, elevam-se as mil pequenas vozes maravilhadas da terra. Apelos inconscientes e secretos, convites de todos os rostos, são o reverso necessário e o preço da vitória. Não existe sol sem sombra, e é preciso conhecer a noite. 

 O homem absurdo diz sim e seu esforço não acaba mais. Se há um destino pessoal, não há nenhuma destinação superior ou, pelo menos, só existe uma, que ele julga fatal e desprezível. No mais, ele se tem como senhor de seus dias. Nesse instante sutil em que o homem se volta sobre sua vida, Sísifo, vindo de novo para seu rochedo, contempla essa sequência de atos sem nexo que se torna seu destino, criado por ele, unificado sob o olhar de sua memória e em breve selado por sua morte.

Assim, convencido da origem toda humana de tudo o que é humano, cego que quer ver e que sabe que a noite não tem fim, ele está sempre caminhando.

O rochedo continua a rolar.

Deixo Sísifo no sopé da montanha! Sempre se reencontra seu fardo. Mas Sísifo ensina a fidelidade superior que nega os deuses e levanta os rochedos. Ele também acha que tudo está bem. Esse universo doravante sem senhor não lhe parece nem estéril nem fútil. Cada um dos grãos dessa pedra, cada clarão mineral dessa montanha cheia de noite, só para ele forma um mundo. A própria luta em direção aos cimos é suficiente para preencher um coração humano. É preciso imaginar Sísifo feliz.

 Amor
Fonte
ATEUS.NET
http://ateus.net/artigos/filosofia/o-mito-de-sisifo-ensaio-sobre-o-absurdo/
Sejam felizes todos os seres. 
Vivam em paz todos os seres. 
Sejam abençoados todos os seres.

A MENSAGEM DE EMMANUEL - TRABALHO È A SOLUÇÃO


MENSAGEM DE EMMANUEL

      Retrato de Emmanuel 
pintado por
Alberto André Delpino Filho
Durante Reunião presidida
por Chico Xavier
- Pedro Leopoldo - MG

TRABALHO É SOLUÇÃO !

Que a Luz Bendita do Mestre jorre agora em vossos corações!

Quando a tristeza invadir as horas de vossas vidas ainda emolduradas de tantas viciações emocionais e contingências humanas naturais, ainda de permeio às necessidades da vida carnal para a evolução espiritual, lembrai-vos daquele que mantinha o olhar fixo na imensidão e suportava as punhaladas físicas e morais de quantos irmãos que, em sua ignorância, não enxergavam a sua luz, mantendo-se sempre ativo e à disposição de todos quantos o procurassem, ajudando quanto podia, o que o auxiliavva a enfrentar as horas tristes e as traições do mundo hostil que o espreitava.

Se as imagens do tédio e da amargura ou a sensação de fracasso povoarem os painéis de vossas mentes, não permaneçais longo tempo nessas divagações, pois que retiram de vossa energia vital os mais valiosos recursos reservados para  a vossa provisão energética e espiritual.

Sejam quantas vezes tiverdes caído e tantas quantas ainda cairdes, em decorrência da vossa permanência nas esferas de lutas materiais, por onde as trevas destruidoras sempre tentam vos assolar, em vossas psicosferas mentais e emocionais, tantas serão as vezes que tereis que levantar o ânimo e fazer das quedas as bases para a construção espiritual sedimentada pelos tijolos da experiência.

Nada vos faça parar na marcha abençoada do vosso burilamento moral e na vossa dedicação ao próximo!

Os momentos de angústias são paisagens estagnadoras em que vossas mentes ainda estagiam, sempre repletas de sensações dos resquícios de memórias do vossos passados.

O estágio evolutivo que vos alberga os espíritos permite ainda que, por vezes, desequilibrei-vos emocionalmente, conquanto, ainda assim, é a misericórdia divina que permanece agindo ao vos conceder momentos de vida humana em que esses vários paradigmas emocionais de instabilidades e dúvidas possam propiciar auto-análises, mais detidamente, para que possais retificar atitudes e conceitos estabelecidos indevidamente em vós.

Para todos estes momentos de transe mental em que, por instantes, perdeis a direção de vossos pensamentos e de vossos objetivos, o remédio é o ''Trabalho'!

O 'trabalho', como quer que se vos apresente, seja na forma de um serviço doméstico a implorar a vossa mão cuidadosa, ou o cumprimento através de palavras emitidas no veículo telefônico a alguém que vos cobra a tolerância de ouvir seus redemoinhos particulares de sofrimento, bem como na forma de preces revitalizantes que sempre vos são pedidas, serão também 'trabalho', na medida em que irradiem fluidos benfazejos às criaturas humanas e rearmonizem o ambiente em que respirais.

Crises tereis sempre, enquanto vossos espíritos não se rejubilarem no banquete celeste de quando tiverdes alcançado já os estados sublimados da alma. Os desequilíbrios fazem parte do aprendizado enquanto veículos de observação e retificação para o progresso espiritual.

O que não vos pode perturbar, porém, é a sua persistência em vos desviar das trilhas que já tendes escolhido, através da retroalimentação imprevidente e viciosa de pensamentos, sentimentos e ações menos dignas que tomam tempo, paralisam as ações frutíferas, descambando para a ociosidade e consequente estado depressivo.

Fazei a invocação imediata do trabalho quando surja a emoção doentia, o sentimento frustrado, a tristeza e a dor moral, e mantende a 'persistência' nele, ao que se chama  'prevalência' de vós mesmos sobre o mal que vos deseja abater e vos anular.

  Em suas várias modalidades, será sempre o 'Trabalho" a expressão mais gratificante de todas as amorosas ferramentas de auxílio às vossas almas instáveis e vulnerávies às circunstâncias que vos abalam com frequência nestes desfiladeiros de dificuldades da vida terrena.

Trabalho ! Sempre a melhor solução !

Promove o esquecimento do mal, a alegria pelo bem que gera, recicla as energias físicas e saneia a mente e o coração !
 
Que a paz perene de Jesus vos envolva  a cada desafio de vossas vidas, promovendo mais forças em vosso espírito e mais empenho no trabalho de vossas próprias alforrias das vidas atribuladas dos mundos de redenção!

                                         
                                      EMMANUEL
                                           
Mensagem psicografada por Rosane Amantéa
em 30/07/1984, 
na Comunhão Espírita de Brasília.

 Amor
Fonte 
©2010Rosane Amantéa  
Sejam felizes todos os seres. 
Vivam em paz todos os seres. 
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sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

BANDA MOLE - GRITO DE CARNAVAL EM BH

Fernando Duca, Taiguara Tupinambas, Felipe Laffiti e Marco na 35ª Edição do Desfile da Banda Mole (06/02/2010. Sidney Lopes/EM/D.A Press. Brasil)
Fernando Duca, Taiguara Tupinambas, Felipe Laffiti e Marco na 35ª Edição do Desfile da Banda Mole

A Banda Mole marcou o seu tradicional desfile pré-carnavalesco para o dia 26, com concentração às 14h e desfile às 17h, na Avenida Afonso Pena, entre as ruas da Bahia e Guajajaras, no Centro de BH.
Com o enredo “Tiririca no Congreuço, novos tempos de progreuço”, a agremiação pretende pôr na avenida quatro trios elétricos e quatro bandas, além de um desfile da Bandinha Mole, ao som de marchinhas tocadas pela Charanga do Bororó em homenagem ao centenário do compositor Noel Rosa.

PRALEMBRAR 2008:
Banda Mole fará grito de carnaval em BH
Jackson Romanelli/EM/D.A Press - 26/1/08
Como em outros anos, alegria volta a invadir o Centro da capital, desta vez ironizando a crise

Folia garantida para os belo-horizontinos.

A tradicional Banda Mole promete agitar o 
Centro da capital no sábado, dia 14. A concentração começa às 14h, na Avenida 
Afonso Pena, com as duas pistas fechadas, 
entre as esquinas das ruas da Bahia e 
Guajajaras. 

A partir das 16h, a Bandinha Mole, formada 
pela diretoria, velha guarda e fundadores, 
além de representantes do Movimento Machão Mineiro, anima a festa ao som de instrumentos 
de sopro e marchinhas de antigos carnavais. 
A expectativa é reunir 20 mil pessoas.

Depois da Bandinha Mole, que conta

com a participação da Charanga do Bororó,
a agitação da festa fica por conta de quatro
trios elétricos. Os grupos Mareô, Bem Brasil, 
Papa Axé são presença confirmada. Segundo
o produtor do evento, Rômulo Brandão, não
haverá camarote neste ano e os 
organizadores ainda vão definir qual será 
a quarta banda a se apresentar.

O tema deste ano é “Com onda ou 

marola, a banda deita e rola!”, uma 
alusão divertida à crise econômica 
mundial.

“Nosso presidente falou que os outros
países vivem uma tsunami ou uma onda, 
mas que no Brasil é apenas uma marola.

Nossa proposta é garantir que a 
alegria
esteja em qualquer situação, 
independente dos problemas 
financeiros mundiais”, diz Rômulo.

 Amor
Fonte
Jornal Estado de Minas
http://www.em.com.br/app/noticia/gerais/2011/02/08/interna_gerais,208451/banda-mole-faz-tradicional-desfile
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terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

GIRASSÓIS DE VAN GOGH PERDEM O BRILHO


Química escureceu Van Goghs
Pigmento comum durante período expressionista possuia componente sensível a exposição à luz

Como Van Gogh perdeu o brilho
Cientistas descobrem reação química responsável pela deterioração
de algumas das grandes obras artísticas da história, 
como a série “Os girassóis” (divulgação)

Divulgação Científica

Como Van Gogh perdeu o brilho

15/2/2011
Agência FAPESP – Um grupo internacional de cientistas descobriu uma reação química complexa responsável pela deterioração de algumas das grandes obras artísticas da história, produzidas por Vincent van Gogh (1853-1890) e outros pintores famosos no século 19.

A novidade poderá ajudar a barrar o processo que faz com que as telas percam seu brilho e suas cores, como as obras de Van Gogh, cujo admirado amarelo brilhante tem se tornado um apagado marrom com o passar do tempo. O estudo foi publicado na edição de 15 de fevereiro da revista Analytical Chemistry.
Para desvendar os segredos da reação química, os cientistas empregaram diversas técnicas e ferramentas de observação e análise, entre as quais raios X que usam luz síncrotron. Além da análise de obras, o grupo também examinou tubos de tinta conservados desde a época de Van Gogh.

Os pesquisadores envelheceram os pigmentos artificialmente e verificaram que o escurecimento da camada superior estava relacionado com uma redução do crômio na tinta de Cr(VI) para Cr(III).

Os raios síncrotron, de dimensões microscópicas, revelaram o que ocorre na finíssima camada entre a tinta e o verniz. A luz solar é capaz de penetrar apenas alguns micrômetros na tinta, mas o suficiente para disparar uma reação que transforma o amarelo em pigmentos marrons, alterando a composição original da peça.

“O estudo terá continuidade e queremos entender quais são as condições que favorecem a redução do crômio e se há algo que possamos fazer para reverter os pigmentos para seu estado original em telas em que esse processo está em curso”, disse Koen Janssens, da Universidade de Antuérpia, na Bélgica, que dirigiu o estudo.
A decisão de Van Gogh de usar cores brilhantes e novas para a época é considerada um dos grandes momentos na história da arte. O artista holandês escolheu cores que destacassem emoção, em vez de usá-las realisticamente, como era a norma na época.

Sem as inovações na fabricação de pigmentos ocorrida no século 19, essa escolha não teria sido possível. Foi a intensidade dos novos pigmentos, como o amarelo de crômio, que permitiram que Van Gogh atingisse a maestria de obras como a série de girassóis.

O holandês começou a usar as cores mais brilhantes após se mudar para a França, onde conheceu outros artistas, como Paul Gauguin, que compartilharam com ele as ideias inovadoras.


O artigo Degradation Process of Lead Chromate in Paintings by Vincent van Gogh Studied by Means of Synchrotron X-ray Spectromicroscopy and Related Methods, de Koen Janssens e outros, pode ser lido por assinantes da Analytical Chemistry em http://pubs.acs.org/journal/ancham.

 Fonte:
Agência FAPESP
http://www.agencia.fapesp.br/materia/13455/como-van-gogh-perdeu-o-brilho.htm
Wikimedia Commons
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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

AS ORIGENS DA ARTE MODERNA - Pierre du Columbier




Pierre du Columbier – História da Arte – Cap. IX

As Origens da Arte Moderna

NÓS somos até certo ponto vítimas do nosso vocabulário. A uma variação lenta chamamos evolução e supomos com facilidade que em tal fenómeno não intervieram elementos estranhos verdadeiramente novos. Essas evoluções não nos deixam, por exemplo, discernir perfeitamente uma mudança de estilo: é-nos preciso então, de quando em quando, determo-nos um pouco para darmos conta do fenómeno. A lentidão da mutação não prova, de forma nenhuma, que ela se não tenha produzido, como o verificamos no que respeita à passagem do românico ao gótico.

Pelo contrário, uma revolução faria supor, no nosso espírito, um contributo exterior capaz de provocar, na curva que parecia representativa da arte através dos tempos, uma súbita inflexão.
Assim, estaríamos dispostos a admitir que, ao longo dum período que abrange seguramente todo o século XV e que, segundo os lugares, começa mais tarde ou mais cedo no século xiv e excepcionalmente no século XIII, se deram dois fenómenos: no Norte, uma evolução que corresponde à decadência da arte gótica e, em Itália, uma revolução determinada pela intervenção das recordações antigas e que marca o alvorecer da Renascença.

A bem dizer, haveria motivo para desconfiar desta lei imposta a todas as artes: arcaísmo, apogeu e decadência. Ela pressupõe juízos qualitativos por vezes difíceis de justificar.

Ao olhar as coisas de mais perto, reconhecem-se — e isto no Norte como no Sul — tantos fenómenos de nascença como de declínio. E primeiramente este facto singular, tão essencial que se tornará, em suma, característico da Arte Moderna até aos nossos dias: o predomínio do pictural sobre o arquitectónico e o escultórico. E a primeira vez que poderemos e deveremos procurar o núcleo das aspirações artísticas duma época na pintura e este método será tão seguro que de ora avante nos dará, de certo modo, o esquema indispensável. No tempo de que nos ocupamos, esta supremacia da pintura será a tal ponto indiscutível que a escultura se tornará pitoresca e que artistas como Claus Sluter ou Nicolas Gerhaert de Leyde ficarão devendo muito aos pintores flamengos. Todo o sistema das roupagens de dobras cortantes, tão característico da plástica germânica do século xv, tira a sua origem dos modelos gráficos.
Também nos monumentos o decorativo predomina cada vez mais sobre o arquitectónico; todavia, este fenómeno, sem dúvida o mais aparente, não é talvez o mais rico de consequências.

Ao estudar o «flamejante» francês e o «perpendicular» inglês, poder-se-ia pensar que se assiste somente à evolução natural da arte gótica, mas não se tem suficientemente em conta que a tendência essencial se inverteu e que, de ali em diante, os homens já não aceitam como um dogma a preponderância das dimensões verticais.
Todas estas novidades, cuja importância é incontestável, tinham levado um erudito como Courajod a falar duma renascença nos países do Norte. A ideia não era muito feliz, porque, na linguagem habitual, a palavra «renascença» supõe uma ressurreição maciça da Antiguidade e este desvio de sentido poderia provocar grandes confusões.

Conservemos, pois. o termo «renascença» para uma arte que faz ou julga fazer renascer o espírito da Antiguidade e que se manifesta de modo extremamente preciso em Itália. Isto não significa, contudo, que tal conceito de renascença seja tão simples como parecem julgar muitos historiadores. Tudo se passa como se, nesse tempo, se tivessem descoberto a literatura e a arte antigas.

Mas estas descobertas, no sentido estrito, já não havia que fazê-las: existiam manuscritos latinos em todas as bibliotecas da Idade Média, a sua leitura nunca tinha cessado, em virtude da sobrevivência da língua, assegurada pela liturgia cristã. Deve até notar-se que o desenvolvimento literário, dos idiomas nacionais, já antes do século XVI, provocou um recuo do latim. Por outro lado, se se executaram então em Itália algumas escavações frutuosas, que valiam e que nos deram elas em comparação de todas essas ruínas que enxameavam o solo e solicitavam havia muito tempo, à flor da terra, e mais numerosas por certo do que hoje, o olhar dos artistas? Estes ficavam indiferentes a tais ruínas ou, pelo menos, só nelas encontravam temas que interpretavam de bom grado na sua própria linguagem.

Um belo dia, puseram-se a olhar mais atentamente, com novos olhos, e a própria linguagem plástica através da qual se tinham os antigos exprimido impressionou-os de súbito: as proporções das colunas e dos capitéis, as que tinham sido usadas para o corpo humano. Isto determina uma mudança de sensibilidade mais fácil de verificar do que de interpretar e, sem dúvida, única, porque se não parece com a moda arcaizante que tinha dominado, por exemplo, sob o Império Romano: trata-se então duma espécie de acepipe destinado a lisonjear as curiosidades embotadas. Pelo contrário, os homens da Renascença foram radicais e pretenderam ressuscitar a arte antiga: conseguiram-no aliás tão bem que a transformaram de maneira a torná-la viva mas não irreconhecível, pois se afigura impossível negar que, durante pelo menos três séculos, o repertório das formas se tenha inspirado nos modelos grego–romanos.

O Norte

Falando do Norte, adianta-se uma ideia abstracta que não corresponde a coisa alguma no espírito dos homens da época, de todo inconscientes duma oposição que parece aliás não ter existido e que forjámos fora do tempo para comodidade nossa. Mas parece justo recordar uma constelação política de significado certamente considerável, o Estado burguinhão, constituído desde que Filipe o Ousado, em 1363, foi investido no Ducado de Borgonha e que só se desmoronou em 1477, com a morte de Carlos o Temerário, depois de haver durado, em suma, cerca de um século. No entanto, este Estado, que reunia à Borgonha propriamente dita ou Borgonha do Ducado os novos feudos que tornavam os seus príncipes senhores de todas as Flandres, possuía uma corte brilhante, elegante, amiga das artes.

O carácter da pintura no Ducado de Borgonha foi determinado sobretudo pelas Flandres e importa olhar como um acontecimento capital para toda a história da arte o Retábulo do Cordeiro, obra dos irmãos Van Eyck ou, se se preferir, de Jan Van Eyck, pois a figura do seu irmão Hubert parece um tanto grotesca, à falta de obra que possa ser-lhe atribuída e de documentos probatórios: esta personagem foi já contestada como pintor, não aliás sem certa imprudência.
Com este retábulo e mais ainda com as outras obras de Jan Van Eyck, nasceu o quadro de cavalete, tal como no fundo o entendemos hoje, portátil, concentrado, destinado à decoração dos interiores; e é por isso que, nem que este legado tivesse sido único, não deveríamos nunca pretender que a pintura do Norte em breve se gorou.

Eyck foram célebres como inventores da pintura a óleo. Na verdade, eles não a imaginaram e a sua matéria só tem vagas semelhanças com o que nós entendemos hoje por esse nome, no sentido de que o óleo é apenas por ele empregado à superfície, em cores transparentes, sobre fundos trabalhados a têmpera. Inspiraram-se em larga escala, sem dúvida, na iluminura, então muito florescente. Esta precedeu de longe a própria pintura e, neste sentido, é possível reivindicar para a França, sobretudo para a região de Paris e do Berry, onde a tradição desta arte era extremamente forte, uma espécie de prioridade sobre os Flamengos. Tais questões constituem tanto mais matéria para controvérsia quanto é certo que a

Pintura flamenga

A pintura flamenga distingue-se antes de tudo pelo brilho das cores, favorecido por uma técnica de rara perfeição. Durante muito tempo, os Van
iluminura, praticada grandemente em França, era internacional e que a sua obra-prima, de cerca de 1415, As Muito Ricas Horas, do Duque de Berry, que contém maravilhosas cenas miniaturais e paisagens que denotam uma atitude nova do homem perante a natureza, deve-se a artistas vindos das Flandres.
Evitemos, no entanto, diminuir a importância do passo que consistiu em franquear o intervalo entre a iluminura e a pintura de cavalete.

A primeira suporta muito melhor as convenções, o esquematismo. A segunda exige uma observação infinitamente mais intensa, uma observação mais firme e mais cerrada e, sobretudo, profundeza. E aliás comum em França, nesta época, ver lado a lado a mais requintada iluminura e a mais medíocre pintura de painel. Xesta, ninguém poderia contentar-se com algumas anotações felizes. Certos «erros» quase imperceptíveis, certas negligências tornam-se insuportáveis quando ampliados.

Já falamos da profundeza, de que pouco curou a iluminura. Num quadro, ela pode obter-se por dois processos especiais: a perspectiva linear e a modificação das cores com a distância, com a espessura do ar que as separa do espectador ou perspectiva aérea. Os Flamengos nunca mostraram grandes sabedorias na primeira destas perspectivas e, neste domínio, contentaram-se com regras muito aproximadas. Em contrapartida, dedicaram grandes cuidados à segunda. De facto, mostram saber à maravilha como se afrouxam os tons com a distância, colocam admiravelmente as personagens na atmosfera e, pondo de banda o fundo de oiro arcaico, quando abrem, consoante o seu costume, uma janela sobre a planície ou sobre uma das suas cidades tranquilas, representam de forma superior os planos sucessivos de quanto se vê neste enquadramento.

Embora o Retábulo do Cordeiro contenha dois nus, Adão e Eva, visivelmente estudados do natural e imitados com uma espécie de crueldade, os seus autores não se mostraram curiosos do corpo humano. Virtude afectada e maliciosa, por certo. O nu foi para eles terra incógnita e, quando o tratam, sente-se, como o notou espirituosamente Max Friedlaender, que a sua consciência não está de todo tranquila. O que eles perscrutam com infatigável perspicácia é o rosto. Os retratos de Van Eyck e da sua escola, tratados com um grafismo de extrema precisão, contam-se entre os mais individuais que existem — e também entre os mais impiedosos.

O movimento não é de forma alguma o seu forte: entre a rigidez e a gesticulação, não conhecem o meio termo, pois não estudaram a fundo este problema. Os corpos são para eles simples manequins, elegantes cabides e nada mais. Mas, entre os pintores de elegâncias, eles são dos mais requintados: os maravilhosos trajos •da corte da Borgonha, esses corpos de vestido que tanto deformavam as mulheres, essas cores matizadas e brilhantes fornecem-lhes temas de que eles nunca se mostram fatigados, dando aos seus quadros o fulgor das jóias e das gemas.

Eles compraziam-se também — seguindo uma tradição que vinha do século xiv — em atribuir ao vestuário um papel em que não tinham pensado os antigos, para quem ele ficara sempre condicionado pelas atitudes e pelas formas dos corpos que recobria. O seu sistema poderia antes comparar-se ao dos miniaturistas bizantinos e dos escultores românicos, que, interessando-se sobretudo pelo efeito decorativo das roupagens, haviam ordenado as suas dobras encanudadas em volta dum elemento central ou as faziam cair a direito, mas sempre em certa relação com a atitude viva. Os Flamengos preferem dobras de quebras secas e agudas, como as apresentam os tecidos engomados, e, pouco a pouco, essas dobras só importam pelo seu aspecto gráfico, como uma espécie de rede de linhas que se quebram e se cortam, devorando quase o corpo que pretendem abrigar.

A escola flamenga abunda em grandes artistas. Jan Van Eyck tem dignos sucessores, dos quais os mais justamente célebres foram Roger de la Pasture ou Van der Weyden, de Tournai (ao passo que os Van Eyck trabalhavam em Bruges) e Hugo Van der Goes. O seu contributo particular consiste num sentido dramático que ora é a sua força ora a sua fraqueza. A sua força, por exemplo no prodigioso Descimento da Cruz, do Escurial, em que Van der Weyden logrou descobrir, numa composição monumental e admiravelmente equilibrada, sem sombra de anedota (o que é raro entre os seus compatriotas), a atitude patética da Madalena, que torce as mãos erguidas. A sua fraqueza, pelo contrário, se se encarar um quadro como a Morte da Vtrge7?z, de Hugo Van der Goes, uma das suas últimas obras no entanto e que, quando devia surgir como o seu testamento, é todavia muito inferior aos seus trabalhos precedentes, às belas Adorações dos Magos por exemplo, a de Florença e sobretudo a de Berlim. Porque o artista, na sua sede de dramatismo não soube evitar o esgar: querendo obter a dignidade simples do colorido, renunciou às garridices antigas mas não foi mais feliz e descambou nas tonalidades tristonhas e quase gritantes.
 
Além destes três homens, que a posteridade imediata olhou como os três grandes mestres da pintura flamenga e que — coisa singular para quem conhece os gostos de demolição dos nossos contemporâneos — o ficaram para nós, devem citar-se outros. Não talvez esse mestre misterioso a que se chamou Mestre de Flémalle, na obra do qual se incluíram quadros redistribuídos depois a justo título, segundo parece, e cujos trabalhos mais fortes, vários painéis conservados no Instituto Staedel de Francfort, couberam em partilha a Roger Van der Weyden. Mas Memling, que pertence à geração seguinte e traz à escola um pouco de sonho renano e também uma boa dose de sensaboria e mesquinhez, mas se salva no entanto pela sua ingenuidade e pelo delicioso esmalte dos seus quadros, ou Petrus Christus e Gérard David, mestres, deve dizer-se, por vezes um pouco susceptíveis de se confundir.

Uma tal pintura não podia deixar os escultores indiferentes. Era preciso, no entanto, que esta influência achasse matéria digna em que exercer-se. Nesse tempo, as Flandres tornaram-se o centro de fabricação de retábulos de madeira esculpida e de pintura, que se inspiram visivelmente nas descobertas dos mestres, mas que são de nível muitíssimo baixo e de banalidade em geral enjoativa. Felizmente, surgiram dois artistas que, sem renegar o pitoresco dos efeitos, eram capazes de lhe acrescentar uma expressão plástica: o Holandês Claus Sluter e Nicolas Gerhaert de Leyde.

O primeiro trabalhou sobretudo no Ducado de Borgonha, em Dijon, de que fez uma segunda pátria e onde constituiu uma oficina, na qual se encontram a mão-de-obra local, representada por exemplo por Le Moiturier, e obreiros de origem estrangeira, como La Huerta. Parece que as qualidades sólidas e graves dos artífices borguinhões actuaram por seu turno sobre Claus Sluter, para lhe conferir o singelo poder que se admira nos acompanhantes fúnebres que rodeiam o túmulo de Filipe o Ousado, outrora na Cartuxa de Champmõl hoje no Museu de Dijon, ou nas figuras do portal, ainda hoje no seu lugar primitivo, da capela desta mesma Cartuxa. Uma grandeza épica, que não consegue evitar certa turgidez, distingue o Poço de Moisés, em que alguns pretenderam reconhecer, com indulgência, sinais precursores da arte de Miguel Angelo.

Em volta de Sluter, enraíza-se aliás uma escola, que se torna cada vez mais borgonhesa e que nos dá obras como o imponente Santo Sepulcro de Tonnerre e o túmulo pintado, um tanto teatral, mas de efeito dramático tão feliz, de Philippe Pot (Museu do Louvre). Aqui, o elemento plástico retomou o comando, mas, se se quiser ter em conta os impulsos a que estava sujeita esta escultura, demasiado pictural, há que ir a Brou, onde Margarida de Austria, para perpetuar a memória de seu marido Filipe o Belo, lhe mandou construir uma sepultura esplendida, em que as encantadoras e esbeltas estatuetas têm a garridice de bonecos de loiça de saborosa fantasia.
Quanto a Gerhaert de Leyde, enraizado também em solo estrangeiro, em Estrasburgo, achamos a sua obra original no seu país de eleição.

De tudo o que criaram estes Borguinhões das Flandres e dó Ducado, a arquitectura não é o que pode considerar-se de menor riqueza, mas a sua qualidade parece secundária. Ela não conta grandes edifícios religiosos e os que foram feitos então não merecem atenção particular. Em contra-partida, os monumentos civis multiplicaram-se e atingem um luxo desconhecido até à data. Luxo no fundo um tanto bárbaro, que nasce da acumulação e complica, pela decoração, o gótico, sem o enriquecer. Tortura-se a pedra cada vez mais, faz-se dela uma verdadeira renda que reveste as muralhas. Nas Flandres em particular, em que a riqueza abunda, é o tempo das câmaras municipais com grandes torres sineiras como as de Bruxelas, de Liège, de Lovaina e dos vastos mercados.

A Itália

Se se quiser descobrir as origens da revolução que se deu na Itália, há que recuar a uma época muito anterior ao Retábulo do Cordeiro, a uma data do século XIII, em que floresciam em França os grandes lavrantes góticos da pedra. Surgiu uma dinastia de escultores que tiraram o nome da terra onde se ilustraram, os Pisa-nos, e ornaram a sua pátria de adopção e algumas outras cidades italianas com obras de estilo novo. Nicolau, sem dúvida originário da Apúlia, era o mais velho; fez em particular o púlpito do Baptistério de Pisa, terminado em 1260, e começou o da Catedral, acabado cinquenta anos depois, por seu filho João. Acaso estes Pisa-nos suplantam os seus confrades da outra banda dos Alpes pela força plástica? De forma nenhuma. E, se se fizer uma comparação neste particular, ela ser-lhes-á por certo desfavorável. Encon-trar-se-iam facilmente na própria Itália escultores capazes de com eles rivalizar. Mas deve-se-lhes qualquer coisa que será fértil em consequências: deixaram-se cativar por esses sarcófagos romanos que se encontravam em abundância no seu país e até na sua própria cidade.

Não eram modelos maravilhosos, mas podiam ensinar a estes homens o que eles não sabiam e aquilo a que aspiravam. Neles descobriram os Pisanos o reflexo de formas cuja nobreza havia sido grande e um conhecimento dos corpos humanos e das suas atitudes que se adivinhava através duma tardia e medíocre imitação. A sua admiração juntaram eles boa dose de servilismo: dos sarcófagos romanos copiaram personagens inteiras e inspiraram-se até no que eles tinham de mais contestável: o estilo narrativo bastante grosseiro que era o dos Romanos. Ora a Renascença Italiana ultrapassa infinitamente esta arte, está na confluência do ideal antigo e da magnífica observação pessoal. Aqui, esta escasseava bastante.

Giotto Eis porque a reputação dos escultores de Pisa, embora bastante legítima, porque estes homens tomam proporções de precursores, não poderia, a nenhum respeito, comparar-se à dum pintor que viveu mais ou menos de 1267 a 1337 e que se chamava Giotto, florentino, contemporâneo de Dante. Os estudos muito desenvolvidos feitos em torno deste artista e dos que o precederam só contribuíram para pôr em relevo um génio pessoal. Vasari dava-lhe por mestre e precursor Cimabue, ao qual atribuía o mérito de ter arrancado a pintura dos seus compatriotas ao hieratismo bizantino. Mas Cimabue volatizou-se de certo modo ao fogo da crítica moderna.

Reconheceu-se primeiramente que a arte bizantina, então reinante, estava longe de ter a imobilidade sagrada que se lhe censurava e que artistas desta tradição, como os Cavallini, em Roma, eram autores de obras de grandeza pouco comum. Reconheceu-se ainda que, em volta de Cimabue, e junto dele, se manifestava uma curiosa fermentação: artistas de Lucca e de Pisa tinham executado obras que pediam meças com as dele e nas quais se notava um desejo igual, pelo menos, de se libertarem de cânones demasiado tirânicos. Não é menos exacto que, ao lado de Giotto, o Sienês Duccio de Buoninsegna, sem dúvida um pouco mais velho do que ele, precedeu-o talvez na arte de compor uma cena com numerosas personagens e de nela exprimir uma sensibilidade humana. Mas Duccio sofre ainda bastante das convenções, da mesquinhez e até da sensaboria da iluminura, arte que aliás teve em Itália muito menos brilho do que em França. No entanto, Giotto ficou intangível.

Por outro lado, fizeram-se aproximações engenhosas entre algumas das suas pinturas, em particular as suas imitações de baixos-relevos, de Pádua, e a escultura francesa que o tinha precedido. Tais aproximações são sugestivas, mas parecem indicar mais um parentesco de espírito do que uma influência.

Este mestre deixou-nos obras importantes pela extensão e bastante numerosas, algumas das quais são hoje contestadas, como os frescos da Igreja Superior de Assis. Outras foram muito restauradas, como a Morte de São Francisco de Assis, em Santa-Croce, em Florença, mas bastaria em rigor, para o conhecer, um só testemunho, este incontestado e incontestável: os frescos da Capela Scrovegni ou da Arena, em Pádua.
Giotto é por certo um dos primeiros que introduziram nas cenas religiosas a gesta ainda muito recente de São Francisco de Assis, cujo sentimento de intimidade com a natureza e cujo amor pelas plantas e pelos animais constituíram uma fonte vivificadora para toda a arte italiana. Não deveria exagerar-se o paralelo São Francisco-Giotto. O que caracteriza a arte do segundo não é propriamente uma efusão espontânea perante os espectáculos do Mundo.

Quando se pensa no encanto das Fioretti, no seu próprio título, esta arte mais parece ainda reservada e abstracta. Giotto, embora tenha posto de banda o fundo dourado dos Bizantinos, não atribui qualquer importância à paisagem, que indica esquemáticamente pela representação dum rochedo ou duma árvore. Ele não possui tão-pouco essa suavidade, essa ingenuidade que nos habituámos a pedir aos primitivos. Os rostos são bastante desprovidos de expressão ou contraem-se em esgares, quando perdem a impassibilidade. As figuras, pesadas, muita vez espapaçadas, carecem de elegância. Mas a sua autoridade impõe-se a todos. Os seres pintados pelo artista têm a força convincente das estátuas. Beren-son achou uma expressão que logo obteve o assentimento geral, tão bem ela exprime um sentimento obscuro que se experimentava e se não sabia explicar: falou-nos ele dos «valores tácteis» de Giotto. Com efeito, as suas criaturas pertencem a um mundo que não é somente o das aparências, mas sim o das substâncias impenetráveis.

Depois, ele não perde tempo com os aspectos secundários, não se transvia nas sendas mais deliciosas: prefere caminhar a direito para o seu objectivo. Embora não seja essencialmente um tradutor de movimentos, sabe achar a expressão do verdadeiro patético que dá um sentido a uma cena (a atitude, por exemplo, da personagem que atira os braços para trás ao ver Lázaro ressuscitado).
Poder-se-á falar, a respeito de Giotto, duma influência caracterizada da arte antiga? O problema parece pelo menos duvidoso.

Sem dúvida, perante certas das suas figuras, torna-se lícito perguntar se elas não foram buscar alguma coisa da sua estatura às personagens togadas tão frequentes em Itália. Mas, por outro lado, quando Giotto reproduz um edifício antigo, como o Templo de Minerva em Assis, fá-lo com desconhecimento absoluto das proporções e do próprio espírito da Antiguidade, com hábitos de mão que são a bem dizer hábitos góticos; é certo que se deve talvez aqui ter em conta a espécie de desdém com que ele trata tudo o que não é propriamente o homem.

A lição de Giotto era tão cheia de sobranceria que não foi logo compreendida. Ele teve por certo renome considerável, imitaram-no largamente, mas esse estilo grandioso, essa humanidade poderosa mantiveram-se fechados, inacessíveis, para os pintores chamados giotescos, cujas obras agradáveis e aliás superficiais não conseguem impressionar-nos fortemente. E um conjunto agradável, cheio de pormenores divertidos, mas que nos parece, depois deste magistral pintor, quase pueril. Só Orcagna teria sido talvez capaz de receber uma parte desta herança. Mas quase nada nos resta da sua obra. Em Siena, Duccio, que propunha um ideal menos altivo, achou sucessores mais compreensivos, como Simone Martini e os Lorenzetti.

Quanto a Giotto, houve que esperar mais de 60 anos após a sua morte. Mas então que maravilhoso florescimento! Esse século XV italiano, a que se chama, segundo o modo de cômputo adoptado além-Alpes, o guattrocenío, é uma época prodigiosa. Viu-se porventura jamais, por um desses misteriosos partos que o materialismo histórico procura em vão explicar, viu-se jamais surgir, num tão breve espaço de tempo, tão grandes artistas, tão grandes homens também ? Os Florentinos distinguem-se sobretudo pelo seu génio plástico e pela sua maravilhosa curiosidade.

Quando se comparam estes artistas aos do Norte, nota-se primeiro neles um amor da grandeza, uma espécie de severidade que faltam aos segundos. Não são autores de pequenos painéis, mas de vastos frescos; as seduções da cor não conseguem detê-los; julgar–se-ia quase que alguns de entre eles acham, segundo o dito famoso de Ingres, que uma figura é sempre suficientemente bem pintada quando é bem desenhada. Eles são ainda animados pela paixão científica que consagram às suas pesquisas artísticas, num platonismo prático. O amor da ciência, o culto da beleza e o amor divino encontram-se numa altitude superior e são apenas aspectos diferentes da ascensão para Deus.

O gosto da ciência não basta no entanto para explicar o seu entusiasmo pela perspectiva linear, cuja descoberta é um acontecimento capital na história da pintura. Hoje, vemos apenas nela a observação fastidiosa de certo número de regras de que não sentimos nenhum escrúpulo em nos descartar. Para compreender a embriaguez que se apossou então dos artistas, bastará reflectir na riqueza inteiramente nova dos meios assim postos à sua disposição, que lhes permitiam diversificar a expressão de conjunto da sua obra por alterações em profundidade ou sublinhar uma determinada parte da cena sem recorrer a desproporções bastante grosseiras. Colocando mais ou menos alto o ponto de vista, fazendo fugir as horizontais para tal ou tal região do quadro-eles modificavam inteiramente não apenas o seu aspecto físico, mas também (e é isso que se esquece em demasia) a sua significação sensível.

Aliado à admiração pela Antiguidade, o gosto pelas pesquisas científicas levou os artistas ao estudo do nu, esse maravilhoso filão de que os plásticos jamais se fatigam. Embora os Florentinos, com a sua vontade de tudo definir, de tudo delimitar, sejam muitas vezes belíssimos retratistas (apesar de uma certa tendência para o abstracto não lhes ser estranha), aconteceu-lhes compreender como o tinham feito os Antigos, que o artista pode pedir ao corpo inteiro o que alguns exigem apenas ao rosto, criando assim seres menos individualizados e mais majestosos.

Florença 

 Desta maneira, assiste-se, durante cinquenta a setenta e cinco anos, ao espectáculo duma extraordinária emulação. Animados de generosa rivalidade, todos os artistas trabalham à compita, procurando ultrapassar-se uns aos outros, dando a conhecer, com uma espécie de febre, os seus achados. A cidade é rica; a política, bastante mudável, tem a corrigi-la a estabilidade mercantil — meio por vezes muito esclarecido, por vezes bastante pouco compreensivo e talvez menos favorável do que se pretendeu. Em Florença, o messenato dos Médicis, o interesse constante e esclarecido que estes mercadores tornados soberanos dedicam aos artistas desde a época em que a família ascende ao poder, se são insuficientes para suscitar artistas, favorecem-lhes pelo menos a existência e facilitam-lhes a actividade.

No princípio do século XV, por volta de 1420, vivem na cidade do lírio vermelho três homens de idades diferentes e cujos génios superiores resumem tudo quanto existe à roda deles: um arquitecto, Brunelleschi; um escultor, Donatello; um pintor, Masaccio. Porque, nesta época abençoada, todas as artes caminham a par.

O mais velho, Brunelleschi, duma assentada renovou a arquitectura: a cúpula de lanços de que ele recobre Santa Maria das Flores e cuja elegância constitui ainda um dos encantos da paisagem florentina, anuncia uma outra idade e a rotura com tudo o que era gótico torna-se ainda mais nítida na capela dos Pazzi em Santa Croce, cujo exterior, constituído por um peristilo coríntio, não é talvez tão belo como o interior, em que a brancura das paredes, realçada por uma molduragem sombria, de formas rectangulares ou circulares, mostra alta discreção e vontade inquebrantável de atingir a perfeição graças a uma linguagem apurada, sem recorrer à menor das concessões.

A bem dizer, perante este sistema de proporções, perante esta policromia apontada com rara precisão, é lícito perguntar se Brunelleschi não terá erguido os olhos para uma fachada como a de San Miniato, e, por isso, fica-se muitas vezes surpreendido ante os monumentos desta Renascença Italiana, ao verificar como eles sucederam naturalmente à arte românica.

No Palácio Pitti, o mesmo Brunelleschi criou o tipo do palácio florentino, que os seus sucessores conseguiram levar a um maior grau de perfeição: edifício rude, com bossagens temerosas e cujo único sorriso é uma cornija de perfil impecável e de distinção digna dos melhores modelos antigos. A obra-prima deste género é provavelmente o Palácio Riccardi.
Donatello não surge sem predecessores. Menos de dez anos o separavam do ourives Ghiberti, que, em 1403, triunfara dos seus rivais no concurso aberto para a execução das portas do Baptistério de Santa Maria das Flores. Sobretudo a última dessas portas, a «porta do Paraíso», começada em 1425, suscita a admiração geral. Ela conservou aliás o mesmo poder de sedução sobre as pessoas pouco sensíveis aos grandes efeitos da escultura e que procuram antes de tudo o acabamento e a finura do trabalho.

Nos quadros em relevo, admiravelmente compostos, de personagens múltiplas, que ornam esta porta, há com efeito espantosa habilidade, mas também certa mesquinhez; no entanto, Ghiberti teve o mérito de restituir ao baixo-relevo a variedade, fazendo avultar diversamente as figuras do fundo: vai duma forma quase inteiramente modelada, quase desprendida do plano geral, até um perfil quase apenas desenhado, que mal sobressai nesse plano.

Donatello, muito menos popular, é um homem diverso. Nas suas obras da juventude — púlpito exterior da Catedral de Prato, tribuna de Santa Maria das Flores (no Museu da Obra desta igreja), revela sentido apurado do movimento e da musculatura e, ao mesmo tempo, o que faltava a Ghiberti, o espírito «escultórico» ; isto é, os efeitos simples de forma e de volume. O que ele criou ainda em Florença — o corpo elegante do David, os bustos endiabrados de vida, como o de Nicolo de Uzzano — empalidece perante as suas obras paduanas. Quando as começa, o artista tem cerca de sessenta anos — e a estátua equestre do «condottiere» Gattamelata, cavalgando sereno em seu corcel, consubstancia o grande tema da Antiguidade, de que a Antiguidade nos deixou de facto apenas um exemplo, no fundo bastante fraco, o Marco Aurélio do Capitólio : o herói triunfante, em sua montada.

Notou-se entre a carreira de Donatello e a do seu sucessor florentino Verrocchio, que o segue a cinquenta anos de distância, um paralelismo que denota sem dúvida uma influência, mas que não diminui a personalidade de Verrocchio. Este, que possuía aliás um belo talento de pintor, era sem dúvida, como escultor puro, inferior a Donatello, mas calculava melhor o efeito produzido sobre a multidão, a «impressão» literária, como nós diríamos hoje, a do assunto adoptado. Desse modo, o Colleone, o outro «condottiere», em Veneza junto da Igreja dos Santos João e Paulo — embora o cavalo seja nitidamente inferior ao do Gattamelata — graças à sua curvatura heróica, ao seu rosto de áspera expressão, ao peso da armadura, possui um tom épico de que o Gattamelata é quase de todo desprovido.

São, nesta época, õs dois grandes escultores de Florença. Luca delia Robbia (1399-1482) tinha rivalizado com Donatello no concurso para a execução da tribuna de Santa Maria das Flores e a sua destreza é tal que, aos olhos da maioria, leva a palma ao seu competidor, pois sabe exprimir o encanto familiar das figuras infantis, dos meninos de coro que cantam. Todavia, a reputação dos delia Robia (porque eles formam dinastia) fez-se com as suas terras–cotas esmaltadas, em que dominam o azul, o branco e o amarelo, mas que apresentam ainda muitos outros tons, obras fáceis, populares, de lindo sentimento decorativo por vezes, como no Hospício dos Santos Inocentes de Florença ou em Pistóia, mas, em suma, bastante monótonas e pouco severas, na preocupação exclusiva de agradar.

Ao lado dos soberbos bronzistas que são Donatello e Ver-rocchio, devem citar-se ainda os marmoristas, autores de bustos excelentes e de monumentos fúnebres de boa composição: Mino de Fiesole é um dos melhores de entre eles. Não têm a poderosa originalidade dos medalhistas, que igualam esta arte, geralmente miniatural à grande escultura, graças à imperiosa decisão do desenho. Pisanello é, neste domínio, incomparável, e o seu traço a ponta de prata no Codex Vallardi do Louvre não fica a dever nada às obras dos mestres do Extremo-Oriente.

Para abranger tudo o que nos traz Masaccio, pintores de génio morto aos vinte e sete anos depois de ter tido tempo suficiente para deslumbrar os’ seus contemporâneos com uma obra notável, os frescos da capela Brancacei, basta comparar um dos seus frescos, Adão e Eva expulsos do Paraíso terreal, ao Adão e à Eva do Retábulo do Cordeiro, que lhe é alguns anos posterior. As duas personagens de Van Eyck hão-de parecer então duma indigência de observação surpreendente. Poder-se-á até assacar-lhes uma espécie de complacência sensual quase vizinha da impureza. Masaccio aprendeu com Giotto, de que é, durante pelo menos uma geração, o herdeiro, a submissão total dos protagonistas ao drama que desempenham e sabe exprimir esta submissão por meios muito mais variados.

A despeito do movimento de pudor de Eva, 
que esconde ao mesmo tempo os seios e o sexo, 
Adão e ela só se sentem nus para os olhos de Deus 
que os expulsa, e não já para os dos espectadores.

Todas as suas atitudes concorrem para exprimir a fuga e o desespero. Além disso, não são fantasmas coloridos para nosso prazer, têm uma solidez, uma firmeza que lhes são conferidas por grandes luzes e grandes sombras simples.

Um cortejo mais numeroso ainda do que o dos escultores rodeia Masaccio, o pintor. As tendências são aliás muitíssimo diversas e acentuadas. Masaccio tem como amigo um compatriota, que lhe sobrevive longo tempo mas que se lhe não assemelha em nada, Fra Angélico de Fiesole. Dir-se-ia que o Irmão Angélico colocou o sentimento no primeiro lugar. A sua serenidade, a sua suavidade vão direitas ao coração e há poucos espectáculos tão emocionantes como o do Convento de São Marcos, onde ele empenhou toda a sua alma a pintar Cristo e a Virgem com uma super-abundância de tons claros, cristalinos e brancos. Nos seus painéis, o artista conserva ainda mais reminiscências da iluminura, talvez por causa dos fundos doirados que mantém nas suas primeiras obras. Neste ponto, mostra-se atrasado, até em relação aos Flamengos, que tinham compreendido que com simples cores se podem obter efeitos tão brilhantes como com o metal. E todavia o monge está longe de fechar os olhos ao que se passa à sua volta nas coisas da pintura e, na capela de Nicolau V em Roma, já no fim da sua carreira, torna-se claro que ele assimilou as descobertas do seu confrade mais novo.

Pretendeu-se legitimamente que a arte do Angélico é por essência religiosa. Por certo, mas somente porque a alma do artista era religiosa. Com técnica de facto muito semelhante, com o mesmo registo de tons alegres e frescos que lembram um pouco a aguarela, o seu discípulo Benozzo Gozzoli desenvolveu, no Palácio Riccardi de Florença, sob o pretexto duma adoração dos Magos, o cortejo mais mundano e mais anedótico que se possa imaginar, o dos seus augustos protectores, os Médicis.

Outro cronista encantador e encantado das festas de Florença: Ghirlandajo, o das grinaldas, que, ao contrário de tantos outros Florentinos, não quebrou a cabeça na febre de resolver os problemas da sua arte, limitando-se a pintar, nos seus frescos de Santa Maria a Nova, as belezas florentinas. Demais, Ghirlandajo, muito prejudicado com a hostilidade do Sr. Berenson, era capacíssimo duma deliciosa emoção, como o mostrou na história de Santa Fina em San Gimignano.

Filippo Lippi, muito mais velho que Ghirlandajo e contemporâneo de Masaccio, teria estado muito mais próximo deste último-se não fosse certa falta de gravidade que nunca lhe permitiu ir tão longe como ele o fazia crer: na Catedral de Prato e, não se nota somente um sentido do encanto feminino que este monge, tão pouco exemplar como Fra Angélico fora impecável, era capacíssimo de experimentar, mas também uma soberba composição da cena e figuras de homem de vigor pouco comum.

Mas haveria sobretudo que pôr de lado certos sucessores de Masaccio, que, como bons Florentinos, juntaram ao seu gosto da rebusca plástica habilidosas especulações. Assim o rudíssimo Andrea dei Castagno, cujo Cenacolo, tão próximo do Convento de São Marcos, está longe de alcançar a mesma popularidade. Na arte de Castagno, uma brutalidade inegável encobre uma força que o não é menos e o seu desenho procura rivalizar em dureza com a escultura numa pintura a imitar baixo-relevo como a do túmulo do «Condottiere» Hackwood em Santa Maria das Flores e sobretudo nas suas figuras, isoladas e poderosas como estátuas, de Farinata degli Uberti ou de Pippo Spano. Quanto a Paolo Uccello, é em especial sobre a perspectiva que fez incidir os seus estudos; colorista agudo e singular, fica no fundo um iluminador; os seus quadros de batalhas têm uma imobilidade por assim dizer metálica e ele procura curiosos efeitos de paralelismos de lanças, de simplificações de volume, naturalmente conseguidos graças às armaduras. O desenhador, maleável e preciso, é de primeira ordem.

Enfim, um artista difícil de classificar, que se considera muitas vezes, talvez sem razão, a encarnação do génio florentino, conquanto, em seu excessivo requinte, se represente sobretudo a si próprio: Sandro Botticelli (1444-1510). Pela data da sua morte, penetra largamente no século xvi. Muito culto, por certo, e humanista a tal ponto que procurou reconstituir a Calúnia de Apeles, de que só nos resta a descrição, mas sobretudo desenhador subtil e ama-neirado, que mostra pela linha em toda a sua pureza um gosto quase mórbido, que lembra o Extremo-Oriente. Cria um mundo à parte inesquecível, no qual, sob a suavidade que encanta as velhas inglesas, se escondem segredos tortuosos, um mundo quase asfixiante à força de alusões, de indicações literárias; exaspera ao mesmo tempo que seduz e obras como a Primavera ou o Nascimento de Vénus fazem sonhar aqueles mesmos que mais resistem aos seus sortilégios. E dir-se-ia que outro Florentino, Piero di Cósimo, canta, com as suas cenas mitológicas quase caricaturais, a palinódia desta melodia.

Italia Central

A virtude de irradiação de Florença em Itália é imensa e certos artistas da Itália Central poderiam passar por florentinos de adopção. Nada os distingue nitidamente dos seus inspiradores. O escultor Jacopo delia Quércia era pouco mais velho que Donatello. Siena, ao lado da sua escola de pintura por vezes adocicada, produziu este génio másculo. As linhas escritas a seu respeito por Vasari devem fixar-se: ele atribui-lhe o mérito de ter ressuscitado o baixo-relevo capaz de dar ilusões de ópticas, tal como os antigos o tinham conhecido. Para nós, o portal de S. Petrónio em Bolonha situa este artista na família das grandes almas aparentadas com Masaccio.

Tudo se passa realmente como se Piero delia Francesca, de Borgo San Sepolcro, na Umbría, e Luca Signorelli, de Cortona, também na Umbría, houvessem nascido em Florença. O primeiro enfileira, atrás de Uccello, na categoria dos sábios, dos rebuscadores ; todavia, o seu génio teve mais largueza que o do Florentino. Ele prima em criar grandes formas densas, imóveis, de majestade soberba. Nos seus frescos da História da Santa Cruz, em Arezzo, deu toda a medida das suas possibilidades. Quanto a Signorelli, é também sábio, mas menos no estudo da matemática que no do corpo humano, da figura escorchada. Retomando em Orvieto o tema medieval do Apocalipse, consegue renová-lo com imaginação grandiosa e terrível. Teve sem dúvida um émulo em Melozzo de Forli, ao qual o tempo não foi favorável e de cujo valor só podemos ajuizar por fragmentos como o fresco conservado no Vaticano, em que se vê o Papa Sisto IV perante o qual se ajoelha o seu bibliotecário : os rostos são de bela energia e a cor atinge intensidade bastante rara no fresco.

Mas esta Umbría que alimentou os génios notáveis de Piero delia Francesca e de Signorelli produz como por contraste o delicioso pintor anedótico cognominado Pinturichio (o borrador), Bernardino Betti de seu verdadeiro nome, desenhador bastante frouxo, mas que desenvolve, na Biblioteca da Catedral de Siena e nos aposentos Borgia do Vaticano, o seu alegre e fresco talento, e também o Perugino (Pietro Vanucci), mestre de Rafael e que, depois de ter suscitado admirações excessivas, é hoje objecto de exagerados desdéns: importa conhecê-lo, não pelas suas Madonas em série, mas pela sua emocionante Crucificação de Florença.
Em Rimini, onde há o messenato dos Malatesta, «condotieri» sumptuosos, é objecto de alta protecção o arquitecto-escultor Alberti, de aptidões universais, grande teórico e grande admirador da Antiguidade, que, para os seus protectores e para Isotta, a bem-amada de Segismundo Malatesta, ergueu um edifício curioso, uma igreja chamada geralmente templo, ern que se aliam a imitação bastante estrita das modas antigas e o gosto da profusão decorativa, menos puro que o dos Florentinos e que mais se aproxima da Itália do Norte.
Itália do Norte Mantegna, paduano, liga-se mais pelas suas tendências ao meio florentino que ao meio veneziano, de que é tão vizinho e sobre o qual exerceu no entanto, através do seu cunhado Giovanni Bellini, influência considerável. De todos os artistas italianos que tiveram a paixão do antigo — e Deus sabe como são numerosos — Mantegna é o mais fanático.

Cada uma das suas personagens é uma estátua. Já Vasari lhe exprobava imitar em demasia os modelos de pedra. E uma censura que merecia ser examinada de mais perto. Primeiro, não é justo atribuir a esta única tendência o carácter plástico das suas personagens. Os esforços para obter a expressão escultural na pintura são frequentes na época: já foram notados em Uccello, em Piero delia Francesca, em Signorelli: a ciência da profundidade preocupa diversamente os artistas mais lúcidos dessa época. E aliás propriamente de pedra que Vasari tem razões para falar?

Mais parece que sejam a quebra da madeira e o trabalho profundo da goiva nesta matéria o que nos lembram figuras como o São Sebastião do Louvre. Indo mais longe, poder-se-ia perguntar se esta espécie de evocação da escultura de madeira na pintura não corresponde a aspirações bastante gerais, que tanto se encontram em Cósimo Tura, de Ferrara, como no Alemão Pacher (sem dúvida influenciado por Mantegna), ou no Português Nuno Gonçalves. Esta censura feita a Mantegna, génio de facto muito variado^ parece bastante injusta. Porque este sábio amador de escorços, nos quais mais tarde pensará Rembraudt, sabe achar a graça nas musas dançantes do Parnaso, nos amores da «Câmara degli Sposi» em Mantua, onde inaugura uma decoração fértil em ilusões ópticas que é uma das primeiras do seu género, enquanto atinge o patético na Crucificação do Louvre. Os seus cartões do Triunfo de César,transcrição demasiado flagrante dos baixo-relevos romanos, têm certa frieza. Quanto às suas gravuras a água-forte, foram elas um veículo essencial da influência italiana fora da Itália.

Pelo seu casamento, Mantegna tornara-se cunhado de Giovanni Bellini e estabelecera desse modo relações estreitas com os pintores de Veneza. Esta cidade teve sempre tendência para marcar, em Itália, uma posição à parte e, a datar de então, individualizou-se com vincada nitidez. Os seus pintores não gostam como os Florentinos, de arrazoar acerca dos problemas da pintura; preferem só se ocupar da sua arte no que ela tem de mais brilhante e por vezes até de superficial, deixando aos outros o trabalho das descobertas, que por vezes eles próprios não desdenham e acabam depois por explorar.

Por outro lado, na história das relações da arte italiana com o exterior, Veneza desempenha importantíssimo papel. Numa época em que os pintores eram grandes nómadas, as conquistas flamengas não podiam passar despercebidas, até em Itália. Em dada altura, a pintura flamenga teve ali grande voga, como o testemunham por exemplo, a grande Adoração dos Magos de Van der Weiden, pintada pelos Portinari, ou as pinturas executadas na galeria do Duque de Urbino por Justo de Gand. Entretanto, os artistas florentinos (ao contrário dos amadores) não parecem ter mostrado nessa ocasião grande curiosidade pela pintura flamenga, que denunciava preocupações tão diferentes das suas. Mas na Península há uma região privilegiada no que respeita ao intercâmbio com o Norte: Veneza, as suas possessões de terra firme e, até certo ponto, Pádua, cuja universidade recebia muitos Flamengos e Alemães. O comércio põe a cidade das lagunas em relações estreitas com os países do Norte, aos quais serve de entreposto para as regiões de além-mar. Por outro lado, o gosto dos Venezianos pelos espectáculos e pelas festas torna-os sensíveis ao fulgor cromático da pintura flamenga.

Um pintor do Sul da Itália, Antonello de Messina, vindo de Nápoles, onde a corte do Rei Renato de Anjou formava outro centro de influência flamenga, serviu de intermediário em Veneza, onde fez carreira. Atribuíram–lhe o mérito de ter introduzido a pintura a óleo em Itália. Embora esta história só contenha provavelmente uma parte de verdade, é certo que os seus curiosos e enérgicos retratos, de pequeno formato, atestam considerável influência nórdica. Os gostos da cidade dos Doges são de certo modo retardatários, se se considerar a arte com os mesmos olhos dos Florentinos. Na sua arquitectura, no século XV, ela compraz-se em formas muito inspiradas do gótico, embora se não possam dizer propriamente góticas. Imitadas do antigo, são-no menos ainda. Os edifícios são muito ornamentados, muito decorados, com galerias abertas, em que se adopta com frequência o arco ultrapassado: dir-se-ia um orientalismo libérrimo. Um palácio como o Ca’d'Oro (a casa do oiro) tem fisionomia especificamente veneziana. Quanto à escultura, a despeito de correctos monumentos funerários (esta cidade sem cavalos mostra particular predilecção pelas estátuas equestres) não destituídos de dignidade, ela é bastante medíocre: Veneza nunca foi uma cidade de grandes escultores.

Em compensação, é fértil em pintores deliciosos: Gentile Bellini e Vittore Carpaccio libertaram-se quase de todo das tradições bizantinas, particularmente persistentes na sua terra, para fazerem incidir a sua atenção sobre os espectáculos que os rodeiam e de que se mostram muito ávidos. O primeiro passeou a sua curiosidade até à Turquia; o segundo, divertido e maravilhoso narrador de lendas como a de Santa Úrsula, que lhe serve de pretexto para pintar cenas familiares, mostra-se delicado observador da luz.

Giovanni Bellini, irmão de Gentile, é exemplo duma destreza bastante rara de encontrar através da história da arte. A sua longevidade — pois viveu de 1430 a 1516—permitiu-lhe conhecer muitas gerações, muitas tendências; de tudo aproveitou com desenvoltura e sem abdicar da sua personalidade, que mais se vinca ainda nas suas paisagens do que nas obras restantes. Mantegna ensinou-lhe as virtudes dum desenho cheio de carácter, quase anguloso, Antonello de Messina a suavidade das cores flamengas. Entre a Puta, enérgica, dura, quase seca de Brera, e a Alegoria, pintada para a galeria de Afonso de Este depois terminada pelo Ticiano e de que ele pintou as portas laterais, há quase um abismo.

Como Veneza, a Lombardia é bastante refractária às novidades ou, pelo menos, a admiração severa pelo antigo não determina uma reviravolta de mentalidade. Durante todo o século XV, trabalha-se na Catedral de Milão, mantendo-lhe o aspecto gótico que ela tomara na origem, e consultam-se arquitectos do Norte, sem se chegar a um resultado muito brilhante: dir-se-ia que se prossegue contra vontade um empreendimento começado imprudentemente.

No entanto, a imitação do antigo assume forma bastante particular: recobrem-se os monumentos dum manto de arabescos de fraco relevo, dum bordado esculpido em que sátiros, homens nus, aves, grifos se misturam com candelabros, folhagens, balaústres. A despeito da sobrecarga dos ornatos, este estilo não é destituído de encanto, porque pouco afecta a planta dos edifícios. Concebida e executada segundo estes princípios, a fachada da Cartuxa de Pavia teve o dom de deslumbrar os conquistadores vindos da outra banda dos Alpes.

A demasiada quantidade de mármores diversos que nela se exibem lembra, até certo ponto, uma obra de joalharia; mas os ornatos de terra cota, num dos claustros, merecem mais atenta apreciação pela sua elegância íntima. Este género de decoração, que tinha a vantagem de poder aplicar-se, como fita ao metro, sobre todos os edifícios, qualquer que fosse a sua estrutura, obteve êxito prodigioso, em virtude precisamente da facilidade do seu emprego. Exigia artífices hábeis e não propriamente verdadeiros escultores.

A escola lombarda não poderia, neste aspecto, comparar-se com a florentina e até o Bambaja, que se superou a si próprio no monumento fúnebre erigido à memória de Gastão de Foix, herói de vinte anos, fica, apesar de tudo, num plano secundário. Secundários também os pintores, como ó Borgognone, que, a despeito duma energia vivaz um tanto rústica, tem um ar desajeitado, com qualquer coisa de provinciano. Os

Países Germânicos

Uma anarquia política acentuada e um esplêndido desenvolvimento mercantil partilham entre si a Alemanha. Os príncipes e mais ainda as cidades apossaram-se do que o Império deixara escapar das suas mãos enfraquecidas. A Hansa estende a rede das suas feitorias pela maior parte do Mundo então conhecido. Assiste-se a um desenvolvimento extraordinariamente rápido das cidades.

Se atentarmos bem, vemos que uma delas, Nuremberga, por exemplo, com os seus regulamentos de urbanismo, dá mostras de grande envergadura. E, no entanto, não é isso que salta ao pensamento, quando se atravessam as suas ruas: esses homens evidentemente audaciosos, que não cessaram de percorrer o Mundo em cata de vastas especulações, têm uma arquitectura florescente mas irreme-diavelmente pequena.

A Alemanha está recoberta de casas que datam dessa época, a qual deu a Nuremberga e a algumas outras cidades o seu aspecto actual, a despeito de numerosíssimas recons-truções. Só se vêem empenas agudas, com remates finamente lavrados, patios com galerias e escadarias esculpidas, janelas estreitas, varandas apoiadas em cachorros (Erker), quartos com decorações de madeira e um ar de intimidade, todo um transbordar de sensibilidades, uma Stt?nmung que nos encanta. Se, todavia, no amontoado das nossas recordações, procurarmos um monumento, teremos certa dificuldade em o desencantar.
 
Fazem-se então muitas igrejas de dimensões médias e poucas catedrais (a Igreja de Ulm, que tem dimensões de catedral, mas não a sua categoria, constitui uma excepção). O tipo que predomina é o da Hallenkirche, em que as naves laterais têm a mesma altura da nave principal — edifícios claros, um tanto áridos, que, conservando embora as características exteriores do gótico, não conseguem produzir o seu efeito, porque a sua verticalidade é pouco acentuada. Um grupo destes edifícios distingue-se no entanto pela sua originalidade: é o grupo das igrejas de tijolo do Nordeste. Desde o século xiv, o emprego deste material sugere aqui soluções curiosas, que originam um verdadeiro estilo, muito diferente daquele que a França tinha elaborado em Albi por exemplo. O tijolo determina mais frequentemente traçados em linha quebrada do que em curvas contínuas. As empenas em forma de escadas repetem-se muitas vezes. Por outro lado, a alternância dos tijolos vidrados pretos e vermelhos aumenta o número das variantes de que pode lançar mão o ornamentista.

Existem muitos destes monumentos, em particular nas regiões de colonização das grandes ordens militares, teutónicas e de gladiadores; e Brandeburgo, velha capital prussiana, de sentinela, nos seus pântanos, contra os Eslavos, possui alguns em extremo característicos. Uma produção pictural muito abundante associa-se as mais das vezes à escultura, em retábulos de dimensões imponentes, em que, diversamente do que se passava nas Flandres, a segunda é sensivelmente superior à primeira. 

O’ método adoptado nestes estudos pela erudição alemã e a preocupação louvável de fazer valer tudo quanto se liga ao passado do país nem sempre conseguiram convencer-nos de que esta pintura tenha méritos muito elevados. Quase todos os centros, aliás muitíssimo numerosos, dependem estreitamente da pintura flamenga. O mais célebre é o da escola de Colonia, brilhante e adocicada, com Estêvão Lochner e o Mestre desconhecido da Verónica. Há também que distinguir uma escola de Ulm. Na de Nuremberga, alternam mestres muito vigorosos, bastante rudes, como o do altar Tucher, com artistas como Pleydenwurff, que se limitam a plagiar os Flamengos. Entretanto, de todas as escolas germânicas, a única que se pode considerar profundamente original é a da Suábia, com Conrad Witz. Muito influenciado pela Borgonha, Conrad Witz imprime às suas obras um carácter pessoal menos elegante, um tanto rústico. No fragmento de retábulo que nos mostra Cristo no Lago de Genesareth, foi um dos primeiros a pintar uma paisagem estrictamente copiada do natural.

Durante a segunda metade do século XV, desenvolve-se uma arte em que a Alemanha, desta vez iniciadora, adquire logo de início mestria inegualável: a gravura. Gravura em madeira primeiramente destinada ao povo, mas que, graças à imprensa, recentemente nascida, dará a excelentes artistas ensejo de se afirmarem na ilustração; gravura em cobre, mais preciosa, muito próxima da ourivesaria pelo trabalho a buril ou prestando-se, pelo contrário, a uma grande liberdade pela ponta seca.

Os Alemães enriquecem este trabalho não somente com o seu virtuosismo, mas também com um grafismo muito saboroso, um desenho agudo e quase agressivo. O mais notável é o renano Martinho Schongauer, o belo Martinho, pintor também da célebre Virgem do Roseiral, mas gravador muito mais variado, muito mais atraente. Em contacto com ele e com o meio artístico de Estrasburgo, encontra-se um pintor estranho, Mathis Nithart, que, até há poucos anos, era designado pelo nome de Grunevvald e cuja cronologia foi por completo alterada por recentes

investigações, que o situaram numa. geração anterior àquela a que se supunha pertencesse.

Não é contudo provável que Grunewald se confunda, como admitem certos eruditos, com um gravador curioso, o Mestre do Livro de Razão ou do Gabinete de Amesterdão, cuja liberdade de feitura contrasta com a maneira regrada dos gravadores de pro fissão. Mas Grunewald é incompreensível sem o antecedente dos gravadores. 

Sob o seu nome, reuniu-se uma obra importante que abrange quadros de que ele não é por certo responsável; mas basta para nós que ele seja o autor do retábulo de Isenheim, hoje no Museu de Colmar e que constituía um sumptuoso conjunto de pintura e de escultura. Neste retábulo, a escultura é de alto mérito mas a pintura dir-se-ia uma espécie de prodígio. Não pode esta comparar-se a nada do que se fazia então na Alemanha e, deve acrescentar-se, em qualquer outra parte. Achamo-nos perante um indivíduo de temperamento excepcional, um visionário que se exprime sobretudo através da luz. Sobrenatural, trágica, ora fulgurante, ora lívida, ora decomposta nos tons do prisma, a fulgurar como um fogo de artifício, ela ilumina a grande Crucificação, cujo magro Cristo estende os membros nodosos, ou a Ressurreição, em que Jesus é devorado pelo halo que o envolve, ao passo que tombam por terra os guardiões do túmulo. Essa luz acalma-se e torna-se cristalina na Natividade. O artista conhece certamente algumas gravuras italianas e até, sem dúvida, pinturas, mas a sua arte é diametralmente oposta ao espírito daquelas. Ele encarna estritamente a sua época, muito diferente da idade gótica, pois acrescenta ao gótico uma ciência e uma inquietação até ali insuspeitadas.

Na outra extremidade da Alemanha, ele encontra uma espécie de emulo muito diferente e menos trágico em Pacher, cuja origem artística é muito mais clara e que decerto atentou em Mantegna e nas suas pesquisas plásticas.

Este Pacher, sabemo-lo hoje, era ao mesmo tempo escultor e pintor e por certo sucedia o mesmo com Mathis Nithart, conhecido por Grunewald. O trabalho do escultor e o do pintor achavam-se aliás intimamente ligados nos grandes retábulos. Pensando nesta origem comum, concebe-se facilmente que os escultores alemães» sobretudo os escultores em madeira, apresentem tantas reminiscências gráficas, a mais flagrante das quais é o sistema das pregas na roupagem.

O vestuário conta para eles muito mais do que o corpo, espécie de manequim quase indiferente e muitas vezes inaceitável. O artista mostra-se muito ávido de movimento, mas dum movimento que é muito menos o movimento próprio das personagens do que uma agitação vinda do exterior, uma espécie de vento que agita as roupagens e as arrasta num turbilhão. Esta escultura do século XV é a arte popular da Alemanha, tão popular como o foi a do século XVIII na França. Por toda a parte pululam obras anónimas, que raras vezes são indiferentes.

Dois grandes mestres são Tilman Riemenschneider, da Fran-cónia, e Veit Stoss, de Nuremberga. O primeiro trabalha ao mesmo tempo a pedra e a madeira e, sem ser destituído de lirismo, evita resvalar nos excessos de alguns dos seus contemporâneos, graças a um sentido plástico muito pronunciado. Sofre aliás as influências ultramontanas, e a tal ponto que esculpiu um nu delicadíssimo— uma Eva. Pelo contrário, Veit Stoss, nascido na Polónia, embora, pela data da sua morte, ultrapasse largamente os limites do século XV, representa tipicamente o génio agitado daqueles a que se chamou impropriamente os últimos góticos, quer no seu imenso retábulo de Cracóvia, quer nas numerosas estátuas que deixou em Nuremberga. As reminiscências gráficas dos Flamengos são nele numerosas e pode ser que esta influência lhe tenha sido transmitida por Gerhaert de Ley de, que parece haver transplantado não somente para Estrasburgo mas ainda para a região renana e para mais longe o gosto das cenas picturais e das expressões dramáticas.

Stoss não é o único escultor de Nuremberga: esta cidade possui um canteiro vigoroso em Adam Krafft e toda uma oficina de bronzistas, a de Peter Vischer o Antigo, cuja técnica é muito bela e que, nesta primeira fase da sua actividade, funde estátuas funerárias e grande número de placas tumulares gravadas, que se espalham por toda a Alemanha e, com as mercadorias hanseáticas, vão até muito longe, até aos confins da Polónia.

A França e a Inglaterra

Numa França esgotada pela guerra dos Cem Anos, não se constroem já catedrais, mas as artes do luxo acham, até certo ponto, uma compensação no mecenato de alguns príncipes, entre os quais convém citar o Rei Carlos V, grande amador de livros, e, depois dele, sobretudo o Duque de Berry, que, no seu Castelo de Mehun-sur-Yèvre, na sua capital de Bourges, dá trabalho a todos os artistas e principalmente aos iluminadores.

Se se quisesse formular um juízo com base apenas na arquitectura, pareceria pouco justificado, à primeira vista, separar do gótico esta época chegada à sua última fase, chamada flamejante. Caracteriza-se ela por um sistema de curvas e contra-curvas que se encontram sobretudo na decoração das janelas. Convém notar, no entanto, que esta ornamentação exuberante, formada por nervuras muito secas, tende a tudo recobrir, ao passo que as dimensões em altura diminuem. São bastante raros os edifícios completos deste estilo, ao mesmo tempo árido e luxuriante: um dos mais típicos é Notre-Dame-de-1′Epine, que se ergue, frágil, no deserto da Champagne; as mais das vezes, são capelas, enxertos feitos fora do tempo em edifícios existentes. Quanto aos edifícios civis, não são comparáveis pelo número nem aos das Flandres nem aos da Alemanha, assim como a burguesia da França não é comparável pela riqueza à destes países. No entanto, Bourges possui na casa de Jacques Cceur o exemplo duma habitação em que o aspecto sumptuoso cede o passo às comodidades do proprietário e em que a curiosidade pelos monumentos ultramontanos se manifesta nas pinturas a fresco das abóbadas.

Se se abstrair da escultura borgonhesa, cujo brilho, sob a influência da pintura flamenga, já foi aqui referido, deve convir-se em que o grande estilo do século xin se adelgaçou singularmente. Encontram-se quase por toda a parte Virgens demasiado bonitas, excessivamente amaneiradas, por vezes garridas, que, para segurar o Menino Jesus, dão ao torso um movimento de compensação exagerado. A arte sofre ainda aqui do perigo bastante internacional de mesquinhez, muitas vezes sublinhado. Só os cultores da arte funerária mantêm uma forte tradição e a renovam, esculpindo as figuras dos mortos sob a forma de personagens orantes, mais em voga do que as personagens jacentes.

Mas, quanto à iluminura, a França é, mais do que nunca, o foco de toda a Europa, um foco internacional que atrai os obreiros de todos os países. No entanto, o estilo da sua produção é notavelmente uno e homogéneo. Aqui, a pequenez é contrabalançada por uma qualidade que de forma alguma a contradiz: o requinte. As Milito Ricas Horas do Duque de Berry, devidas a iluminadores flamengos, quantas obras-primas conviria acrescentar! Citemos algumas: as Horas de Rohan, cujo autor mostra um poder de originalidade que o põe, de certo modo, à margem da escola; o Coração Enamorado, saído do círculo do Rei Renato de Anjou, em que a frescura rivaliza com a rebusca de efeitos luminosos inesperados; as admiráveis Horas de Etienne Chevalier e as Antiguidades Judaicas, nas quais Jean Fouquet, aproveitando certos motivos italianos, emprega, mais ainda do que nos seus quadros, todos os recursos do seu talento.

Porque a pintura de painel está muito longe de rivalizar com esta arte, que, nos limites que lhe são próprios, atinge então os cumes da perfeição. Ela manifesta-se de forma esporádica e, na maior parte das vezes, só causa decepção. Ao passo que as províncias do Norte produzem obras bastante abundantes mas muito medíocres, no Sul o centro artístico mais notável é o de Avinhão, onde os Papas, nos fins do século xv, introduziram a pintura sienesa, chamando Simone Martini e outros artistas, que foram incontestavelmente auxiliados por obreiros locais. Nenhum exclusivismo aliás nesta cidade rica e brilhante, aonde vêm convergir os pintores que querem trabalho. Euguerrand Quarton, de Laon ali pinta a sua graciosa Virgem da Misericórdia, obra complexa em que o tipo dos rostos é muito francês. Mas cada quadro suscita um problema especial. Que vem a ser, por exemplo, a sublime Pieta de Avinhão, de patético profundo e contido, que se liga dificilmente à produção francesa, mas mais dificilmente ainda à produção dos outros países? Que é inclusivamente a Anunciação de Aix? Um quadro flamengo? Por certo, não. Um quadro napolitano? Ninguém ousaria pensá-lo. Um quadro francês, muito influenciado pelos Flamengos? 

Talvez. Nicolas Froment, autor dum retábulo da Ressurreição de Lázaro (Museu dos Ofícios, em Florença) e do grande retábulo da Catedral de Aix, é mais fácil de identificar, mas não passa, no entanto, dum artista de segunda ordem. Inferiores ainda são os primitivos da região de Nice, muito adocicados, que apresentam ao menos uma produção homogénea, aparentada com o que há de mais medíocre em Itália.

Os méritos da Touraine são os únicos que podem pedir meças aos méritos de Avinhão, graças a um só artista, Jean Fouquet. A sua obra de iluminador é a única verdadeiramente identificada e permite passar à sua obra de pintor. Os seus painéis apresentam aliás vestígios dos seus hábitos de ilustrador. Assim, na Virgem do Museu de Antuérpia,  fragmento dum retábulo pintado para Etienne Chevalier, o grupo dos anjinhos azuis e vermelhos. Todavia, estas reminiscências não fragilizaram o estilo de Fouquet, que se mostra sobretudo enérgico nos retratos de homens, como os do doador e do seu patrono, Santo Estêvão (museu de Berlim). E esta energia que falta aos imitadores de Fouquet, como o que pintou o Descimento da Cruz, aliás muito belo, da Igreja de Nouans.

Deveriam agrupar-se algumas obras em torno de outro quadro capital que se encontra em França, na região do centro, e que é um tríptico pintado para a família Bourbon. Nesta obra, a ciência pictural é digna dos Flamengos e nada permite aliás sustentar que o autor não tenha essa origem, embora se distinga por características que seria agradável considerar exclusivamente francesas: uma espécie de curiosidade impiedosa no retrato, uma predilecção por um tipo físico que é bem francês. Estas características serão de natureza a assegurar uma certeza completa ?

Torna-se difícil dize-lo. O certo é que as tentativas, para atribuir uma obra homogénea àquele a quem se chama o Mestre de Moulins não foram muito felizes. O que lhe averbaram com mais verosimilhança — mas esta verosimilhança não é muito grande — é a linda Natividade que se vê no museu de Autun. Entre as duas obras, haveria que admitir uma grandíssima transformação de estilo… Em suma, o tríptico de Moulins permanece muito isolado e a sua atribuição a Jean Per réal, de quem só conhecemos o nome e a celebridade, repousa apenas em argumentos bastante frívolos.

A França, embora não tenha escola, apresenta pelo menos, várias obras-primas. Isto é, no fundo, o principal. Que dizer quando se passa à Inglaterra? Este país não tem quase pintura e a escultura não é mais rica, se se abstrair de certo número de túmulos, que dir-se-iam feitos em série. Mas desforra-se na arquitectura. O gótico, tão popular, não evolui ali para o flamejante, como em França, mas sim para um estilo muito especial, a que se chama o perpendicular. Ele tem de comum com o flamejante também um estilo de decoração, e decoração muito sobrecarregada.

Mas, multiplicando as horizontais, restringindo desse modo os efeitos «ascensionais», tomam aspecto muito particular. Quando se observam sobretudo as numerosíssimas capelas, em especial as capelas da Virgem então acrescentadas a muitas catedrais góticas, por exemplo a capela que se ergue na ábside da Abadia de Westminster, esta união, de nervuras ortogonais e de conjuntos de vitrais causa uma impressão estranha. Se se não hesitasse perante tal comparação, pensar-se-ia quase numa fábrica moderna.

Espanha e Portugal

Na Península Ibérica, é também para a decoração que evoluiu a arquitectura gótica, mas produziu-se ali uma intervenção capital, a das artes orientais, vinda para Espanha através dos Árabes estabelecidos no seu solo e para Portugal de mais longe ainda-Já se fez referência à arte «mudejar», que, com as sinagogas de Toledo, adaptadas ao culto católico, e com a reconstrução do Alcazar de Sevilha, alcançou no século xiv extraordinários êxitos. O movimento prossegue, põr exemplo, no Mosteiro de Guadalupe, que possui um claustro «mudejar» muito belo e muito completo. A Casa de Pilatos em Sevilha testemunha-o ainda no dealbar do século XVI.

Contudo, a Espanha, desde a segunda metade do século xv, elaborou uma decoração a que se chamava frequentemente plateresca para indicar que evoca a arte dos ourives plateros. Na verdade, o plateresco, muito pouco homogéneo e difícil de delimitar, constitui uma espécie de mistura, em doses desiguais, de elementos góticos floridos e muçulmanos com certos elementos da Renascença, que se tornam tanto mais numerosos quanto estes monumentos são de data mais recente. Ele corresponde em demasia por outro lado, ao gosto geral de complicação que originou em França o flamejante, para que dele não falemos aqui. O emprego de arcos conupiais, de balaústres, de escudos, de colunas torsas, ali chamadas salomónicas, não basta para o caracterizar; convém simplesmente sublinhar nele sobretudo a liberdade crescente e até a selvajeria de formas cujo princípio de composição acaba por desaparecer.

Em Toledo a Igreja de São João dos Reis, em Valhadolide o Colégio de São Gregório, em Guadalajara o Palácio do Infantado constituem trechos surpreendentes, menos surpreendentes contudo do que o que se fez mais tarde em Portugal.
Embora os artistas do Norte vindos para Espanha tenham contribuído para formar este estilo, ele não podia contudo ser o género de lição que os Espanhóis tinham ido procurar nas Flandres e na Borgonha. Vimos já o Catalão La Huerta trabalhar na oficina de Claus Sluter. Em sentido inverso, o túmulo enquadrado por personagens lutuosas espalhou-se em Espanha. Obteve ali menos êxito do que os retábulos esculpidos, mas os discípulos ultrapassaram largamente os mestres. Pelas dimensões primeiramente: os retábulos espanhóis constituem verdadeiros monumentos. Pela qualidade, a seguir: com os que foram esculpidos em 1426 para a Catedral de Tarragona, em 1436 para a de Saragossa por Pere Johan de Yallfogona, com os de Gil de Siloê em Burgos e na Capela de Miraflores, temos obras que ultrapassam de longe o nível corrente dos artigos comerciais das Flandres.

Entre os pintores, a influência do Norte não é menos absorvente. Com Ferrer Bassa, os Catalães tinham parecido orientar-se para Siena. Mas foi só fogo de vistas. Viraram-se a seguir e completamente para as Flandres. Em 1428, Jan Van Eyck fez uma viagem à Espanha. Em dada altura este país surge como uma dependência longínqua da sua escola: o Retábulo dos Conselheiros, do Catalão Luís Dalmau, o Auto de Fe\ de Pedro Berruguete, não ficariam deslocados entre os primitivos flamengos. Uma personagem mais forte se afirma com o Andaluz Bartolomeu Bermejo, que trabalha na Catalunha e dá grandeza a personagens por vezes sumárias, duramente trabalhadas. Bastará dizer que alguns críticos, com certa audácia, pretenderam estabelecer pontos de contacto entre a Pieta de Avinhão e a obra deste pintor. Mais recentemente e aliás de maneira não menos gratuita, aproximaram-no outros da pintura portuguesa.

Caminheiros dos mares, exploradores e conquistadores, que escreveram em menos de dois séculos uma epopeia que constitui a sua eterna glória mas que os deixou esgotados, os Portugueses criaram uma arquitectura, ou melhor uma decoração estranha denominada manuelina e que se apresenta, em obras quase contemporâneas, sob aspectos diversíssimos.

Nas Capelas Imperfeitas da Batalha, que deviam completar o Mosteiro — belo monumento do gótico flamejante (*) destinado a comemorar a vitória decisiva alcançada em 1385 sobre os Castelhanos— e que, começadas em 1435, foram enjeitadas em 1520, sonha-se com o Extremo-Oriente. Em bordado caprichoso, pouco profundamente cavado, recobre todos os membros arquitectónicos sem lhes alterar essencialmente a forma, que é, no conjunto, gótica. Nenhum elemento vivo, nenhuma reminiscência material vem perturbar esse sonho linear" em que avultam somente as letras que reproduzem vezes sem conta a divisa de D. Duarte, sob cujo reinado se começou a construção. A bem dizer, as Capelas Imperfeitas não merecem a denominação de manuelinas, pois são em parte anteriores a D. Manuel, que subiu ao trono em 1495.

(1) Adenda do tradutor.
A Torre de Belém, que se ergue hoje, junto das docas no estuário do Tejo, um arquitecto que trabalhara nas possessões marroquinas da sua pátria trouxera talvez de lá as cúpulas aos gomos (embora elas existam também em Espanha, por exemplo na Catedral de Zamora).

O manuelino propriamente dito encontra-se no claustro do Mosteiro dos Jerónimos, em Belém, cuja singularidade não ultrapassa a dos monumentos espanhóis em que provavelmente se inspira 0), mas sobretudo em Tomar, onde se procurava remoçar até certo ponto uma igreja circular dos templários. Ali se encontra a famosa janela que passa por ser o manifesto desta decoração e também do destino marítimo e aventuroso de Portugal. Desencadeia-se ali a licença dos ornatos: tirou-se partido de todos os acessórios da navegação, desde os cabos, os nós, os remos, a esfera armilar, até às madréporas evocadoras dos países longínquos. Tudo isto ao natural, ostentoso, em pleno relevo, com o mais completo desdém pela verosimilhança arquitectónica. Não se poderia ir mais longe> na monstruosidade (2). Era útil que, por sua vez, um tal exemplo fosse dado, pois não se concebe que houvesse podido ter qualquer espécie de sequência. Os próprios Portugueses por certo o

(1) Por certo, o autor não tem conhecimento directo do claustro dos Jerónimos; de outro modo não faria sem dúvida tal afirmação. — Nota do tradutor.

(2) Para Bertaux, «esta janela semelhante às construções das madréporas, dá a impressão de decorar um palácio submarino»; para o insigne arquitecto e crítico Alemão Haupt, ela constitui «a mais estupenda criação da arquitectura de todas as épocas». — Nota do tradutor.
sentiram. Esta decoração não contamina de forma alguma a escultura propriamente dita, para a qual os nacionais não parecem ter tido aliás aptidão muito pronunciada, pois mandaram vir de França bom número de canteiros, estimáveis e sem génio, como João de Ruão e Nicolau Chanterène, que cultivaram uma arte muito circunspecta e não formaram, segundo parece, discípulos notáveis.

Mas, graças a um único artista, Nuno Gonçalves, a pintura portuguesa pôde brilhar com fulgor europeu. Uma única obra monumental, é certo, o Retábulo de São Vicente, em que surgem os príncipes do descobrimento e da conquista. Por certo, Nuno não ignora a pintura flamenga — Jan Van Eyck prolongara a sua viagem até Portugal — mas o seu espírito é muito diverso: menos atraente e mais monumental. Alguns rostos tensos são dignos de Mantegna. A densidade dos corpos, que são como que talhados a podão, evoca as rebuscas plásticas do mesmo mestre, rebuscas essas que, como já se fez notar, preocupavam ao mesmo tempo muitos pintores, quase por toda a parte.

Nuno tinha também desenhado, sem dúvida, os cartões das soberbas tapeçarias tecidas nas Flandres para comemorar as lutas dos Portugueses (tapeçarias de Pastrana). Mas a sua figura algo enigmática permanece até hoje isolada, embora se tenham notado, em torno dele, vestígios indubitáveis duma influência que aliás se assinala mediocremente.
OBRAS CARACTERÍSTICAS



Fonte:
 CONSCIENCIA:ORG
 http://www.consciencia.org/renascenca-as-origens-da-arte-moderna-historia-da-arte
Sejam felizes todos os seres. 
Vivam em paz todos os seres.  Sejam abençoados todos os seres.